terça-feira, 6 de setembro de 2011

Mordaça na Igreja

Autor Mauricio Zágari


Se você está pensando que vou falar aqui sobre PL 122 ou qualquer coisa do gênero desde já peço desculpas por desapontá-lo. Não é sobre esse tipo de mordaça que desejo falar. Não vou tratar da censura que setores externos ao Corpo de Cristo tentam impor a nós, como a história já tão debatida sobre poder ou não pregar que homoafetividade é pecado. Isso eu deixo para os políticos da bancada “evangélica” e para os telepastores em busca de ibope. Preocupa-me muito mais do que isso a mordaça que os próprios cristãos impõem a si próprios.

Naturalmente, os fatos que ocorrem em nosso dia a dia nos levam a refletir e dessas reflexões nascem artigos para nossos blogs. Sou um observador do mundo e o que ocorre ao meu redor me leva a pensar. E, em seguida, a escrever. O que me levou a escrever este post foi o fato de que recentemente fui severamente criticado nos comentários do APENAS por um irmão em Cristo que – certamente movido pelas melhores intenções, tenho total certeza – me acusou, em resumo, de expor irresponsavelmente os males da Igreja no blog como um todo e em especial no post A pecaminosa intolerância dos evangélicos. Ele chegou a questionar meu cristianismo, ao dizer “Alguém que se diz: Membro da Igreja Cristã Nova Vida de Copacabana, RJ. e Formado em Teologia pelo IBRMEC e pelo IBADIG. Deveria ter mais sabedoria e ser mais CRISTÃO.“. Eu nem entrarei por esse mérito, por entender que a profundidade e a sinceridade de minha fé são um assunto que só compete a mim e a Deus e ninguém tem a capacidade ou mesmo o direito de medi-la. Então simplesmente passo por cima dessa parte infeliz do comentário.

Mas aí vêm as partes que merecem observações e que podem levar você, leitor, a reflexões saudáveis. Primeiro, faço questão de ressaltar que o meu crítico fez o que biblicamente é o correto: veio até mim e confrontou minhas opiniões, como Jesus determina em Mateus 18.15. Palmas sinceras para ele. Exortou-me o mano: “Pensa se você está atrapalhando a vontade de Deus“. Logo depois, esse querido irmão prosseguiu: “Pensa nos recém convertidos lendo seu blog, pensa nos ateus lendo seu blog, pensou?“. Hmmm. Aí começamos a entrar na área problemática. Pelos argumentos desse caríssimo irmão, um ateu ou um novo convertido que lessem meu blog poderiam ser levados a se afastar de Cristo ou coisa parecida. E isso merece sérias considerações.

Resolvi escrever sobre o tema porque a atitude desse querido irmão não é isolada. Muitos e muitos cristãos acreditam piamente que os erros da Igreja deveriam ser mantidos nas sombras e que muitas das verdades incômodas que envolvem nossa fé deveriam permanecer escondidas. Não sou um deles. Justamente porque amo Cristo e amo a Igreja e, em vez de perpetuar os absurdos, as heresias e os erros teológicos, prefiro denunciar e DIALOGAR sobre eles, numa tentativa de gerar reflexão e, quiçá, mudança de rumos. Sem ofender pessoas, sem citar nomes, mas debatendo práticas e ideias.

E olha que isso contraria minhas origens. Fui ensinado cedo na minha caminhada de fé que devemos ser omissos em certas verdades em nome de não afastar os ateus ou os novos convertidos do Evangelho. Logo que Jesus me converteu, o Pastor da minha então igreja me ensinou que “há verdades que não se dizem de púlpito”. Como, por exemplo, o fato de Marcos 16 não estar entre alguns dos mais respeitados manuscritos da Biblia, bem como a passagem da mulher adúltera (João 8). Que a história do anjo que agitava as águas do tanque de Betesda (João 5.4) não consta dos textos originais, mas foi uma explicação posta na margem da página para justificar a crença que havia na época entre o povo de Jerusalém.

Outro exemplo: nunca se pode dizer em determinadas denominações (nas quais, em geral, se amaldiçoa o hábito de fazer versões cristãs de músicas “do mundo”) que o hino 185 da Harpa Cristã (“Vem tu, ó Rei dos reis, buscar os teus fieis…“) é uma versão gospel de uma música do mundo (“God save the queen“) ou que o tradicionalíssimo hino “Os guerreiros se preparam” é uma versão gospel do hino nacional (“mundano”) das Ilhas Fiji. Assim como muitas outras músicas da Harpa, do Cantor Cristão e de outros hinários considerados acima do bem e do mal. Sabe “Vencendo vem Jesus” (“Glória, glória, aleluia! Vencendo vem Jesus!“)? Era uma música cantada pelo exército americano na época da guerra civil. Mais especificamente uma canção chamada “John Brown’s Body” (“O Corpo de John Brown”), uma música que contava a história da morte de John Brown com alguns dos seus filhos, num violento esforço individual para acabar com a escravidão. Aí veio uma mulher chamada Julia Howe e pôs uma letra cristã sobre aquela música “do mundo”. Pronto, ganhamos essa pérola da musicografia cristã, cantada há décadas nas nossas igrejas. Mas que é uma versão de uma música “do mundo” (mas shhhhhh, isso não se pode comentar com um novo convertido, fala baixo. Vai que ele se desvia).

O que me ensinaram naquela época é que essas coisas não se comentam, pois podem afastar as pessoas da igreja.

E como fica?

Eu acredito na verdade. Acredito que conheceremos a Verdade e ela nos libertará. Verdade sempre dita, é claro, com educação, respeito e amor pelo próximo. Nunca, jamais, com agressividade. Pois é isso o que diferencia um diálogo de um bate-boca. Se eu quiser ver bate-bocas gospel eu ligo a TV nos programas supostamente “evangélicos” das manhãs de sábado ou em programas matutinos diários da web. Mas eu prefiro o diálogo.

Também entendo o seguinte: aqueles que verdadeiramente foram alcançados por Cristo, que de fato foram chamados das trevas do pecado para Sua maravilhosa luz, aqueles que farão parte do pequeno rebanho que habitará o Céu, esses não são abalados quando ouvem a verdade. Se alguém se afasta de Cristo porque descobriu verdades sobre a Biblia ou sobre a Harpa Cristã que preferia não saber, ou porque leu num blog tão pouco importante como o meu algumas realidades sujas que enlameiam a Igreja de Cristo… então essa pessoa nunca pertenceu ao Corpo de Cristo, nunca foi justificada nem regenerada. Apenas frequentava uma igreja. E se um ateu precisa ouvir mentiras, engodos ou meias-verdades para “se converter”… que permaneça na lama (Ap 22.11). Pois o Espirito Santo é o Espirito da Verdade e trará os seus sem que tenhamos de esconder as sujeiras nem varrê-las para baixo do tapete. Mentira você sabe de quem é filha.

Tempos atrás fui praticamente forçado a me desligar do seminário teológico em que dei aula por nove anos porque, entre outras coisas, comentei a verdade na sala de aula sobre uma certa unção financeira anunciada na TV: que era antibíblica, demoníaca e herética. A direção do seminário preferia que ficássemos em silêncio, deixando os lobos continuarem a dilapidar as ovelhas do Senhor. Eu não, eu preferia proteger o rebanho de Jesus. E olha que era um curso de bacharelado, não de novos convertidos! Mas o fato de eu ter dito a verdade criou tal celeuma que me vi forçado a sair. Só que isso gerou em mim uma consequência: de lá para cá assumi o compromisso com Deus de lutar sempre pela verdade, de falar e proclamar a verdade e deixar o Espirito Santo trabalhar essas verdades nos corações dos homens conforme melhor lhe aprouver. Pois “É preciso obedecer antes a Deus do que aos homens!” (At 5.29b).

Não, não temos de esconder a verdade. Nós, cristãos, somos intolerantes sim. Há sujeira em muitas práticas da igreja sim. E esconder essa sujeira nos torna tão sujos como aqueles que a promovem, faz de nós cúmplices, comparsas. Se um ateu não se converter é porque não respondeu ao chamado de Cristo e não porque eu escrevi no meu desimportante blog certas verdades. Se o novo convertido se desviar é porque não soube andar na graça de Cristo. Meu blog? Irrelevante nesse processo.

E nós, que somos antigos na fé, lidemos com isso com graça, amor, paz e sempre – sempre – a verdade. Isso é ser cristão: ensinar a verdade em amor, discipular os novos, proclamar o ano aceitável do Senhor. Com uma instrução adequada, não será a verdade que afastará qualquer pessoa de Cristo. Na grande comissão de Mateus 28.19, o Mestre nos ordena: “Portanto, vão e façam discípulos de todas as nações”. Fazer discípulos significa formar cristãos sólidos, construídos sobre a rocha, inabaláveis, que resistem a qualquer vento na certeza de estarem alicerçados da Verdade. Não precisamos esconder as verdades e as poluições da Igreja para formar cristãos assim. Precisamos pregar a Verdade, a tempo e fora de tempo. Aquele que são do Senhor a acolherão. Os que não são, a rejeitarão. Sempre foi assim e sempre continuará sendo, pelos séculos dos séculos.

Paz a todos vocês que estão em Cristo.

@MauricioZagari

Extraído do blog "Apenas" do Maurício Zágari

Um comentário:

  1. Já havia lido esse post no blog Apenas...
    Excelente artigo, excelente colocação, excelente debate BÍBLICO.

    Quero ser assim quando eu crescer kkkkkk

    ResponderExcluir

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...